DEVANEIOS

O outro lado do trilho

Há quase dois anos, do lado de cá, eu vivia sem esperança de voltar a ter esperança. Tudo parecia igual, dolorosamente igual. Não lembro exatamente quando foi, mas sonhei com você.

No sonho, a minha avó falava que eu encontraria o amor da minha vida no dia 4 de setembro. “Ele é absolutamente tudo o que você sempre pediu e merece”, disse ela com um sorriso angelical no rosto. Pronto! Acordei com um quentinho no coração, mas uma ansiedade tomou conta de mim. Queria conhecer logo, mas faltavam uns 180 dias para que isso acontecesse. Sim, eu criei um marcador de contagem regressiva no meu celular.

Lembro que toda vez, antes de dormir, eu rezava para sonhar de novo com a minha avó. Eu queria dicas. Onde ele estaria? Como ele seria? Poxa, Vó, a senhora não facilitou. Sei que alguns meses depois eu sonhei com duas mulheres extremamente angelicais que falaram “Calma! Ele está chegando”.

Nesse meio tempo, conheci algumas pessoas, mas nenhuma me despertava um interesse genuíno. Teve um que só falava dele, teve outro que só falava do cargo dele e aí, você chegou. Era fim de agosto e começamos a conversar. Confesso que fiquei com preguiça de sair mais uma vez, conhecer mais do mesmo, me entediar e não sair dos dois dates. A minha regra é clara: o primeiro date é para conhecer e o segundo é para ter certeza que é ruim mesmo.

Você, então, me chamou para comer comida japonesa. Por desencontro de agendas não conseguimos ir logo. E foi no dia 1º de setembro que te vi pela primeira vez. Atravessei o trilho do trem e fui de encontrar. Curiosamente você morava do outro lado do trilho. Enfim, você se atrasou para chegar e achei que tivesse levado um bolo. Decretei que esperaria 15 minutos e depois iria embora. Faltando sete minutos para o seu prazo final, você chegou. E uau! Que gato!

Começamos a conversar, conversar, conversar e conversar. Parecia que não nos víamos há muito tempo e precisávamos colocar o papo em dia. Depois, você me deu o golpe e disse que precisaria ir em casa deixar a comida que sobrou do jantar. Fiquei um tempo parada na porta do seu apartamento me questionando se conseguiria vencer o meu medo. Não medo de você, muito pelo contrário. Medo de dar certo, sabe? Tantas e tantas vezes deram errado que o certo me assusta.

Decidi confiar. Havia tanto tempo que eu não me sentia tão bem assim. Entrei e conversamos, conversamos e conversamos. Quando pisquei já eram 3h da manhã. O encontro que era para ser um jantar de meia hora, virou um date de 8h. Surreal, né?

O segundo encontro: 15h. Com direito a grudinho no sofá, seriado na tv e dormir juntos. As vozes da minha cabeça diziam: “Não durma com ficante. Isso vai dar ruim”. Além disso, a gente se conhecia intimamente olhando nos olhos. O seu olhar me despia e penetrava. Era uma sensação muito louca. Terceiro encontro: 16h juntos. Ultrapassamos o segundo encontro. Uau! Percebi que nos seus braços eu me sentia em casa e isso me assustou demasiadamente.

O medo de dar certo reapareceu. Conversei com algumas pessoas e todas me falavam “vá viver”. Depois de muito pensar, resolvi viver, me entregar. Mas aí você deu um passinho para trás, depois outro e outro. Em princípio, fiquei confusa, mas depois eu entendi os sinais. Por fim, conversamos e entendi que queremos coisas diferentes.

Não tenho raiva, mas estou triste. Não queria dizer, mas chorei. Estou triste por não ter vivido mais e por minha avó ter errado.  Mas agora, pensando bem, me sinto aliviada. Não aliviada por não te ver mais, mas aliviada porque recuperei a esperança de ter esperança. Não deu tempo de você ser o amor da minha vida, mas, de certa forma, você foi a minha cura. Você conseguiu trazer um quentinho para o meu coração, garoto do outro lado do trilho. Obrigada por isso!   

O marcador de contagem regressiva
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