
Fiz as pazes com o maracujá
Quem me conheceu na fase adulta e já saiu para comer comigo, ouviu, com certeza, a frase “eu odeio maracujá”. Em resposta sempre ouvi “como assim? Maracujá é o elixir dos deuses. Você é louca”. Nunca contei essa história para ninguém, mas resolvi não esconder mais esse segredo.
Pega a pipoca e senta aí. A história é antiga. Quando eu estava no ensino fundamental, tinha aulas básicas de inglês na escola. Não lembro exatamente quantos anos eu tinha, mas lembro que além do verbo to be, a professora ensinava coisas básicas como o nome das cores e dos alimentos. Um dia ela disse que maracujá era passion fruit: a fruta da paixão.
Nessa hora, lembrei de todos os garotinhos que já gostei e não me deram bola. Lembrei do outro que me deu bola, mas meu pai proibiu, afinal “namorar só depois dos 18 anos”. Foi aí que decretei: odeio o amor, a paixão e tudo que vem dele, inclusive ele- o maracujá.
Quando algo é repetido várias vezes, ele se torna realidade. Pelo menos na nossa cabeça. Fake it till you make it. A partir desse momento, o gosto se tornou intragável e o cheiro me enjoava. Esse pensamento foi reforçado com a mesma frequência com que eu me relacionava amorosamente.
Quando um desses relacionamentos terminou, saí para almoçar sozinha. Observei as mesas do lado, apreciei a comida e a minha própria companhia. Para brindar esse momento, pedi um suco de maracujá. Isso mesmo, achei que ele desceria mais amargo do que uma pinga vagabunda, mas ele desceu como um uma linda caminhada num campo de lavanda.
Outro dia, durante uma crise de ansiedade, o coração parecia que sairia pela boca. Tomei água, assisti a filmes, tomei banho, tentei contar os azulejos da parede, mas nada acalmou as batidas. Lembrei que tinha um maracujá na geladeira. Por quê? Nem eu sei. Fui lá e preparei o suco mais denso que consegui e bebi. De repente o coração foi acalmando e o mundo desligando. Me vi fechando os olhos e sentindo paz.
Foi aí que entendi que o maracujá poderia ser o meu melhor amigo. Mas como todo melhor amigo, ele nem sempre é doce. Às vezes, ele me faz torcer a cara e arrepia a alma. Talvez por eu não ter crescido com a sua presença, não sei. Mas entendi que ele me amou nos momentos em que mais precisei. Ele é sim a fruta da paixão, do amor…o próprio.

Tem gente que cura...

Deus perdoa. A natureza nunca.
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